Enviada especial à Cidade do Panamá* — Após as crises sanitária e econômica provocadas pela covid-19, em 2020, os países latino-americanos passam por um problema comum para a retomada do desenvolvimento de forma mais sustentável: o aumento do endividamento e a piora do quadro fiscal continua, mesmo após o fim da pandemia. Esse é um dos principais pontos dos debates e discussões durante o primeiro Fórum Econômico Internacional América Latina e Caribe, organizado pelo CAF, banco de desenvolvimento da região, iniciado nesta quarta-feira (29/1), na capital do Panamá.
Combate a investimentos pouco eficazes no desenvolvimento e aumento de investimentos em educação de qualidade serão importantes para o desenvolvimento regional e redução da pobreza nos países da região, de acordo com os palestrantes do evento do CAF. Além do banco, também são organizadores o Grupo Prisa e a World in Progress (WIP). O evento é transmitido pelo canal do Correio no YouTube.
O vice-presidente do Banco Mundial para América Latina e Caribe, Carlos Felipe Jaramillo, em painel de especialistas sobre os desafios, destacou que, em média, 17% dos orçamentos dos países latino-americanos são despesas que ele chamou de “inútil e que não têm justificativa” em meio ao cenário de taxas de juros ainda elevadas em vários países e regiões, inclusive, nos Estados Unidos e na Europa.
“O problema fiscal preocupa muito e as dívidas de muitos países da região estão aumentando junto com as taxas de juros. Houve a pandemia da covid-19, que disparou o rombo das contas públicas, porque a situação das pessoas e das empresas era desesperadora. Mas, agora, o deficit fiscal de vários países está aumentando sem pandemia. E estão aumentando o nível de dívidas em patamares preocupantes”, alertou Jaramillo.
Segundo ele, várias agências de classificação de risco estão preocupadas com o agravamento desse problema. “Elas mostram que o aumento da dívida pública é como uma infecção e, se ela não for atacada logo, depois serão necessários antibióticos com a maior potência possível”, acrescentou.
Jaramillo também destacou a importância dos investimentos em tecnologia e citou o caso do Uruguai, que é um importante exportador de carnes, mas nos últimos cinco a 10 anos, a exportação de serviços na área de tecnologia está em 3º lugar da balança comercial uruguaia. “Os jovens estão se conectando com o exterior e novas empresas de tecnologia, e eu acredito que é aí que está o futuro da economia da América Latina”, afirmou.
José Manuel Salazar-Xirinachs, secretário-executivo da Cepal Comissão Econômica para a América Latina e Caribe da Organização das Nações Unidas (Cepal/Onu), engrossou o coro ao falar sobre os problemas fiscais dos países da região que seguem crescendo menos do que o resto do mundo.
“Temos um ano muito complexo e os países da região têm problemas estruturais e baixa capacidade de transformação. Por isso, eu acredito na importância do trabalho colaborativo para evitarmos uma nova década perdida. O mundo não está crescendo muito e o único jeito é buscar investimentos em educação de qualidade e melhorar o quadro fiscal”, resumiu.
Xirinachs também destacou preocupação com o cenário de queda da fecundidade e perda do bônus demográfico na região. “A migração vai ter um papel importante, mas de forma ordenada”, afirmou. “Os jovens hoje não querem ter filhos, porque temem não terem emprego e, portanto, os incentivos familiares são questões importantes a serem discutidas em um outro debate”, emendou.
Veronica Frisancho, gerente de conhecimento do CAF também fez um alerta sobre as pressões inflacionárias na região. “Em todos os países não há uma convergência dos indicadores e a inflação continua alta e será desafiador para os governos conseguirem se manter com uma política monetária que deverá continuar com juros elevados”, afirmou.
De acordo com a executiva do CAF, Estados Unidos e Europa devem continuar com taxas de juros elevadas, e isso vai se repetir nas exportações dos países latino-americanos “Acredito que não podemos falar de riscos sem oportunidades, e teremos um cenário de baixo crescimento e de inflação elevada. E, nesse contexto, o financiamento é restrito. Portanto, precisamos fazer investimentos estratégicos, olhando para o longo prazo e para setores produtivos, como mineração, energia verde”, explicou.
A carteira do CAF, segundo ela, é de US$ 34 bilhões e o banco vai seguir buscando parcerias para o desenvolvimento regional.
Integração
Outro desafio para os países latino-americanos, de acordo com especialistas, é o cenário de baixo crescimento da China, que registrou expansão do produto interno bruto (PIB) abaixo de 5%, o que demandará menos matéria-prima e commodities agrícolas, e, portanto, será um importante parceiro comercial dos países latino-americanos, segundo os especialistas debatedores do Fórum. Brasil e Argentina, por exemplo, são responsáveis pelas exportações de 50% dos alimentos comprados pelos chineses, de acordo com o vice-presidente do Banco Mundial.
“As taxas de crescimento da China e os problemas vão continuar sendo um mercado grande para a região, menos o México que tem os EUA como destino de 80% das exportações mexicanas”, afirmou Jaramillo.
Felipe Larrain, ex-ministro da Fazenda do Chile, também destacou que a China é um grande importador de produtos da região, especialmente minérios e também ressaltou que o país asiático seguirá sendo um importante parceiro regional.
Salazar-Xirinachs, da Cepal, ressaltou que é muito importante que os países da região olhem mais para a Índia, que tem mais de 1,4 bilhão de habitantes,e está crescendo mais do que a China, e busquem mais parcerias. “Precisamos ver a Índia como um parceiro estratégico regional”, frisou. Ele lembrou que o país asiático ainda tem muita proteção e tem poucos acordos comerciais.
Mais cedo, na abertura do evento, o presidente-executivo do CAF, Sergio Díaz-Granados, destacou a importância do evento e das parcerias entre os países latino-americanos. “Somos ainda uma região imperfeita, mas pacífica. E somos uma das regiões mais empreendedoras do mundo, com alto potencial de inovação”, afirmou. Ele lembrou que 33% das mulheres latino-americanas têm intenção de empreender.
Conforme os dados do CAF, a América Latina e Caribe deverá crescer 2,5% em 2025, abaixo dos 3,3% previstos para a média global. Além disso, são investidos apenas 5% do PIB da região em educação e 50% menos do que se deveria em infraestrutura para que os países latino-americanos pudessem se desenvolver mais. “O propósito deste Fórum é buscar debater sobre os caminhos para a retomada do crescimento e identificar oportunidades estratégicas, como verdadeiros motores no cenário atual”, afirmou Díaz-Granados.
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Sobre o Fórum
O primeiro Fórum Econômico Internacional América Latina e Caribe acontece nesta quarta-feira e amanhã (30), com a presença de líderes globais e especialistas no Centro de Convenções do Panamá. Mais de 1,5 mil pessoas participam do evento e acompanham as principais plenárias, sessões simultâneas, reuniões privadas e lançamentos que buscam fortalecer os sistemas de logística da região e destacar o papel estratégico da filantropia na construção de soluções sustentáveis.
*A jornalista viajou a convite do CAF
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