O Exército de Israel admitiu que seus soldados cometeram erros nos ataques que resultaram na morte de 15 trabalhadores humanitários no sul da Faixa de Gaza, em 23 de março. A mudança de versão ocorre após a divulgação das imagens do celular de um paramédico — que foi enterrado junto de outros 14 colegas em uma vala comum no enclave — que contradizem o relato inicial das Forças de Defesa de Israel (IDF). O registro mostra que as ambulâncias e o caminhão de bombeiros nos quais os trabalhadores viajavam estavam claramente identificados e com as luzes de emergência ligadas quando foram atingidos por uma saraivada de disparos de tropas israelenses.
O comboio atingido era composto por ambulâncias da Sociedade do Crescente Vermelho Palestino (PRCS), um carro da ONU e um caminhão de bombeiros da Defesa Civil de Gaza, que se dirigiam para prestar socorro a vítimas de bombardeios israelenses, na região de Rafah.
Inicialmente, Israel havia afirmado que os veículos “se aproximaram de forma suspeita” na escuridão, e que não havia sido feita qualquer coordenação prévia com o Exército. Contudo, o vídeo gravado por um dos paramédicos mortos, divulgado pelo New York Times, mostra os veículos com as luzes acesas e marcações visíveis, contrariando a alegação das IDF.

Vídeo de ataque que matou grupo de socorristas em Gaza contradiz versão de Israel
Israel admitiu, portanto, que seu relato anterior de que os veículos se aproximaram sem luzes era impreciso. Segundo a agência Reuters, um oficial das IDF disse no sábado que “o que entendemos atualmente é que a pessoa que dá o relato inicial está enganada”.
— Estamos tentando entender o porquê — disse, acrescentando que o Exército israelense segue investigando o caso e que um relatório deve ser entregue.
O Exército, no entanto, sustenta que seis dos paramédicos mortos estavam ligados ao Hamas, mas não apresentou provas até o momento.
— De acordo com nossas informações, havia terroristas lá, mas esta investigação não acabou — afirmou o oficial à Reuters.
As IDF também reconhecem que os profissionais estavam desarmados no momento do ataque. O único sobrevivente do episódio, Munther Abed, paramédico do Crescente Vermelho Palestino, relatou à BBC que os veículos estavam claramente identificados e com as luzes acesas.
O Crescente Vermelho Palestino e a Organização das Nações Unidas exigem uma investigação independente sobre o incidente.
As IDF prometeram um “exame completo” do incidente, dizendo que “entenderiam a sequência de eventos e o tratamento da situação”.
As mortes dos trabalhadores humanitários têm gerado escrutínio e condenação internacional nos últimos dias. A ONU e o Crescente Vermelho Palestino afirmaram que os trabalhadores não portavam armas e não representavam ameaça. O presidente da Sociedade do Crescente Vermelho Palestino, Younis al-Khatib, ressaltou que os corpos foram atingidos a curta distância, e que Israel não ofereceu informações sobre o paradeiro dos socorristas desaparecidos durante dias, mesmo sabendo “exatamente onde eles estavam”.
Demorou cinco dias após o ataque para que a ONU e o Crescente Vermelho negociassem com o Exército israelense uma passagem segura para buscar os desaparecidos. No domingo, equipes de resgate encontraram 15 corpos, a maioria em uma vala comum rasa, junto de ambulâncias destruídas e um veículo com o logotipo das Nações Unidas. Um integrante do Crescente Vermelho Palestino segue desaparecido, e Israel não informou se ele está detido ou foi morto, disse al-Khatib.
A área onde o comboio para no vídeo foi registrada por imagem de satélite algumas horas depois e analisada pelo Times. Naquele momento, as cinco ambulâncias e o caminhão de bombeiros haviam sido removidos da estrada e agrupados. Dois dias depois, uma nova imagem de satélite mostrou que os veículos aparentemente haviam sido enterrados. Próximo à terra remexida havia três tratores militares israelenses e uma escavadeira. Além disso, tratores ergueram barreiras de terra na estrada nos dois sentidos a partir da vala comum.
Ahmad Dhair, médico legista que examinou alguns dos corpos no hospital Nasser, em Gaza, afirmou que quatro dos cinco trabalhadores humanitários que analisou foram mortos com vários disparos, incluindo ferimentos na cabeça, no tronco e nas articulações. Um paramédico do Crescente Vermelho que estava no comboio foi detido e depois libertado pelos militares israelenses, e forneceu um relato testemunhal dos tiros disparados pelas forças de Israel contra as ambulâncias, segundo a ONU e a Sociedade do Crescente Vermelho.
Dylan Winder, representante da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho nas Nações Unidas, disse que foi o ataque mais mortal contra trabalhadores da organização em qualquer parte do mundo desde 2017. Volker Türk, alto comissário da ONU para os direitos humanos, declarou que uma investigação independente deve ser conduzida, e que o episódio levanta “novas preocupações sobre a possível prática de crimes de guerra por Israel”.
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