A Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) votou nessa quarta-feira (12/2) a revogação da Lei 10.820/2024, que gerou intensos protestos e paralisações no estado. A norma, aprovada em dezembro de 2023 sem consulta prévia, modificava o Sistema de Organização Modular de Ensino (Some) e o Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (Somei), afetando diretamente a educação presencial em territórios indígenas e em comunidades de difícil acesso.
A votação ocorre após um recuo do governador Helder Barbalho (MDB), pressionado por indígenas de diversas etnias, que ocupam a sede da Secretaria de Educação do Estado (Seduc) há 31 dias, e pela greve dos professores da rede estadual, iniciada em 23 de janeiro, que conseguiu paralisar mais de 60 municípios do estado. Na última semana, Barbalho assinou um Termo de Compromisso, garantindo a revogação da lei e a criação de um grupo de trabalho para discutir uma nova política de educação escolar indígena.
A Lei 10.820/2024 foi aprovada sem consulta prévia às comunidades indígenas e aos profissionais da educação. Sua revogação se tornou uma demanda prioritária para indígenas e professores, que apontavam riscos à educação presencial em territórios afastados. O texto excluía artigos que garantiam a educação modular indígena presencial, abrindo brecha para a substituição do ensino por modalidades a distância (EAD).
A insatisfação com a medida gerou uma série de manifestações. Como mostrou o Correio, em 21 de janeiro, quando cerca de 500 indígenas bloquearam o quilômetro 922 da BR-163, em Belterra, no oeste do Pará. O movimento foi ganhando força e mais etnias passaram a se juntar à luta contra a Lei 10.820. Os indígenas passaram a ocupar a sede da Seduc em Belém, enquanto professores da rede estadual decretaram greve dois dias depois, já que a nova legislação também trazia impactos negativos para a carreira do magistério.
Durante o período de ocupação da Seduc, o governo estadual tentou obter na Justiça uma ordem de desocupação, argumentando que os manifestantes estavam prejudicando o funcionamento da secretaria. No entanto, em 4 de fevereiro, a Justiça Federal revogou a ordem de despejo, reconhecendo que o protesto era pacífico e não impedia o funcionamento da Seduc. A juíza Maria Carolina Valente do Carmo determinou que a ocupação não comprometia significativamente as atividades da secretaria e, portanto, não havia motivo para o despejo imediato dos manifestantes.
A mobilização ganhou força e repercussão nacional, a ponto de a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, intervir e participar das negociações com o governo estadual. Pressionado por todos os lados, o governador Helder Barbalho recuou e anunciou, na semana passada, que enviaria à Alepa um projeto para revogar a Lei 10.820/24.
Pelas redes sociais, o professor indígena do Baixo Tapajós, Poró Borari, disse que, mesmo com o avanço das negociações, os indígenas reforçam que a ocupação continuará até que a lei seja oficialmente anulada. “Vai estar em pauta no plenário desta quarta. Vamos fazer nossos cantos e rituais para sairmos com a vitória e uma cópia dessa revogação. Mas tudo ainda precisa da sanção do governador. O estado demonstrou interesse em revogar a lei. Agora é aguardar o resultado final”, disse o líder, frisando que a desocupação da Seduc só será encerrada após a revogação oficial da lei ser publicada no Diário Oficial do estado.
Fim da greve
Os professores da rede estadual de ensino do Pará realizaram uma assembleia geral anteontem, quando decidiram suspender temporariamente a greve, após a assinatura do Termo de Compromisso do governo. No entanto, segundo o professor Thiago Barbosa, coordenador estadual do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Estado do Pará (Sintepp), a mobilização continua, com reuniões e monitoramento até que a revogação seja oficialmente publicada. “A Lei 10.820/2024 trouxe prejuízos à categoria, alterando regras sobre carga horária, gratificações e plano de carreira”, contou.
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A lei previa a exclusão de artigos que garantiam a educação indígena presencial, criando um cenário que favoreceria a implementação do ensino a distância nas aldeias. Também alterava o funcionamento do Sistema Modular de Ensino (Some) e do Sistema Modular Indígena (Somei), fundamentais para garantir a educação em regiões de difícil acesso.
Além disso, sua aprovação gerou insegurança jurídica sobre a permanência dos professores indígenas e de outros profissionais da educação vinculados a essa modalidade. Com a revogação, o governo garantiu que não haverá penalidades aos professores que aderiram à greve e que será criado um grupo de trabalho para discutir um novo Plano de Cargos, Carreira e Salários dos Profissionais da Educação.
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