O juiz que presidiu o julgamento contra o ex-presidente Donald Trump por suborno a uma ex-atriz pornô adiou a sentença do caso para 26 de novembro, três semanas após as eleições presidenciais dos Estados Unidos. A decisão, anunciada nesta sexta-feira, representa uma vitória significativa para o candidato republicano, que tem buscado reverter sua condenação e recuperar a Casa Branca. Como justificativa, o juiz Juan Merchan explicou que a medida foi tomada em parte para evitar qualquer aparência de tentativa de influenciar o resultado da corrida presidencial.
Antes, o anúncio seria feito no dia 18 deste mês. Em uma carta de quatro páginas, Merchan escreveu que “esta não é uma decisão que este tribunal toma levianamente” e que “este caso é único, em um lugar singular na história deste país”. O magistrado, que frequentemente é acusado pelo ex-presidente de parcialidade, também afirmou que decidirá sobre o pedido de Trump para anular o veredicto com base na imunidade presidencial até 12 de novembro. Embora a medida evite um espetáculo judicial na reta final da campanha, o adiamento em si ainda pode impactar a eleição, já que manterá os eleitores no escuro sobre se o candidato presidencial eventualmente cumprirá pena de prisão.
Em maio, Trump tornou-se o primeiro ex-presidente americano a ser condenado criminalmente na História dos EUA, após um júri popular considerá-lo culpado de todas as 34 acusações das quais era alvo em um caso sobre falsificação de registros de negócios para encobrir um escândalo sexual que ameaçava prejudicar sua campanha presidencial em 2016. A sentença, contudo, foi adiada por meses: inicialmente prevista para 11 de julho, ela foi remarcada para setembro a pedido da defesa de Trump, que solicitou que o juiz considerasse o pedido de anulação do caso com base na decisão da Suprema Corte, que concedeu ao ex-presidente imunidade para ações oficiais como mandatário.
Não está claro se a divulgação da sentença de Trump neste mês o ajudaria ou prejudicaria politicamente. Se por um lado sua punição poderia ser um lembrete embaraçoso de seu histórico criminal, ela também poderia impulsionar as alegações de martírio político. A decisão, no entanto, ocorreu a pedido do ex-presidente, que comemorou o anúncio nesta sexta-feira. Em sua rede social, Trump escreveu que “a caça às bruxas em Manhattan foi adiada porque todos perceberam que não houve caso, eu não fiz nada de errado”. Ele acrescentou que o caso deve ser encerrado enquanto os americanos se preparam “para as eleições mais importantes da História do nosso país”.
“Não deveria haver sentença na casa às bruxas de interferência eleitoral do promotor de Manhattan”, escreveu Steven Cheung, o porta-voz da campanha do republicano. “Como determinado pela Suprema Corte dos Estados Unidos, este caso, e todas as outras farsas [da chapa] Harris-Biden, deveria ser arquivado”, continuou.
A decisão do juiz de adiar o procedimento provavelmente irritará os apoiadores liberais do procurador Alvin Bragg, que apresentou o caso, e alimentará as acusações de que Trump está acima da lei, protegido das consequências da condenação, ao contrário de qualquer outro criminoso. O ex-presidente pode ser condenado a até quatro anos de prisão, embora o juiz também possa impor uma sentença mais curta ou apenas liberdade condicional.
Decisão marca mais um atraso
A decisão de adiar a sentença para depois das eleições de 5 de novembro marca mais um atraso — uma constante em todos os casos criminais de Trump desde que ele foi indiciado quatro vezes (em Nova York, na Flórida, em Washington, D.C. e na Geórgia) em 2023. O caso da Flórida, em que o republicano foi acusado de reter documentos sigilosos em uma mansão em Mar-a-Lago, foi arquivado pelo juiz em julho, embora o conselheiro especial ainda esteja apelando dessa decisão. Os outros dois casos relacionados ao 6 de janeiro, quando houve a invasão do Capitólio, estão em suspenso e não devem avançar antes das eleições.
No caso de Manhattan, o único dos indiciamentos que chegou a julgamento, os advogados de Trump passaram meses construindo uma teia de desafios legais: houve pedidos de adiamentos, solicitações para anular o processo e manobras improváveis para tentar transferi-lo para o tribunal federal. A decisão desta sexta foi tomada apesar dos esforços anteriores do juiz de tratar o ex-presidente como qualquer outro réu — embora ele claramente não fosse. Trump insultou o juiz, tentou removê-lo do caso e fez até mesmo ataques pessoais à filha do magistrado, uma consultora política democrata.
O juiz Merchan, por sua vez, impulsionou o caso por mais de um ano e impôs uma ordem de silêncio ao ex-presidente, proibindo-o de expor a identidade do júri, atacar testemunhas, promotores e a própria família do juiz. Em maio, menos de uma semana após ter sido multado em US$ 9 mil (R$ 50 mil, na cotação atual) por violar nove vezes a ordem de silêncio, Trump foi novamente repreendido — e Merchan alertou que o republicano poderia receber uma ordem de prisão caso continuasse desrespeitando a medida.
O primeiro julgamento criminal de um ex-presidente dos EUA teve como pano de fundo os esforços de Trump para encobrir um escândalo sexual: na véspera das eleições presidenciais de 2016, na qual saiu vitorioso, ele teria subornado Stormy Daniels, a atriz pornô, para que ela não comentasse sobre uma relação extraconjugal ocorrida uma década antes. Segundo a Promotoria, o republicano realizou uma série de fraudes contábeis em sua empresa, a Organização Trump, para mascarar o pagamento de US$ 130 mil (R$ 726 mil) à atriz em troca do seu silêncio.
A quantia teria sido paga pelo seu então advogado, Michel Cohen, testemunha-chave do processo. A acusação também incluiu acordos semelhantes ao de Daniels para encobrir outros potenciais escândalos. É o caso de uma relação com uma ex-modelo da revista Playboy e de um porteiro da Trump Tower que afirmou que o ex-presidente teve um filho fora do casamento (um contrato assinado com as palavras “Filho ilegítimo de Donald Trump” foi mostrado ao júri, segundo o New York Times). O republicano se declarou inocente de todas as 34 acusações.
Para o promotor da Suprema Corte de Manhattan, Alvin Bragg, as ações de Trump para evitar que o caso fosse divulgado antes das eleições de 2016, nas quais ele foi eleito, correspondem a um caso de interferência eleitoral. Já a defesa do ex-presidente insistiu que os promotores estavam tentando apresentar “atividades perfeitamente legais, como celebrar acordos de confidencialidade, de maneira negativa”. O advogado Todd Blanche declarou à época do julgamento que “não há nada de errado em tentar influenciar uma eleição: chama-se democracia”.
(Com AFP, New York Times e Bloomberg)