Os promotores venezuelanos convocaram pela terceira vez nesta quinta-feira o candidato da oposição Edmundo González Urrutia, sob investigação após acusar fraude na eleição presidencial de 28 de julho, para depor na sexta-feira, advertindo que o desrespeito ao tribunal levará a um mandado de prisão. As últimas duas convocações foram ignoradas pelo ex-diplomata sob o argumento de que o órgão está agindo como um “acusador político” que o submeteria a uma situação “sem garantias de independência e devido processo legal”.
“Se o senhor não comparecer perante esta promotoria na data indicada acima”, disse a intimação, “será considerado que há risco de fuga (…) e de obstrução (…), de modo que o mandado de prisão correspondente será processado”. A intimação tem como foco o site no qual a oposição, liderada por María Corina Machado, publicou cópias de mais de 80% das atas a que alegam terem tido acesso e que, segundo afirmam, comprovam a vitória de González contra o presidente Nicolás Maduro. O chavismo considerada essas atas “forjadas”. O Centro Carter, um dos poucos observadores internacionais do processo eleitoral na Venezuela, disse que as atas eleitorais coletadas pela oposição são “consistentes”, afirmando que González venceu de maneira clara e “por uma margem intransponível”.
Ameaçado de prisão anteriormente pelo presidente Nicolás Maduro e na clandestinidade há quase um mês, González (que completa 75 anos nesta quinta-feira) é responsabilizado pelo procurador-geral da República, Tarek William Saab, juntamente com María Corina por instigar os protestos contrários à reeleição de Maduro que resultaram em 27 mortes, duas delas de militares, quase 200 feridos e mais de 2,4 mil detidos.
Em 5 de agosto, o Ministério Público anunciou a abertura de uma investigação contra González e María Corina por “instigação à insurreição”, entre outros crimes, depois de estes terem pedido às Forças Armadas (que juraram “lealdade absoluta” a Maduro) que cessassem a “repressão” aos protestos e virassem as costas ao chavista, em uma carta aberta nas redes sociais.
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A intimação, como as duas anteriores, não especifica se ele foi convocado como acusado, testemunha ou perito, de acordo com a lei venezuelana. Fala apenas em “dar uma entrevista em relação aos fatos investigados por este escritório” pelo suposto cometimento de “usurpação de funções” e “falsificação de documento público”, crimes que podem levar, em teoria, à pena máxima de 30 anos de prisão.
A falta de especificação foi levantada pelo ex-diplomata nas redes sociais no domingo, ao afirmar que Saab “tem se comportado reiteradamente como um acusador político” e que o Ministério Público pretende submetê-lo “a um questionamento sem especificar em que condição devo comparecer (acusado, testemunha ou especialista, segundo a lei venezuelana) e com a pré-qualificação de crimes não cometidos”.
Na terça-feira, a principal coalizão opositora da Venezuela denunciou o que descreveu como “perseguição judicial” contra seu candidato. “A reiterada convocação do Ministério Público busca justificar um mandato de execução contra nosso candidato vencedor, para acentuar sua perseguição”, afirmou a Plataforma no X, formada por dez partidos opositores.
No dia anterior à nova convocação do ex-diplomata, a líder da oposição participou de uma concentração em Caracas que marcou um mês desde as eleições venezuelanas que, segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), deram vitória a Maduro com 52% dos votos.
A convocação e ameaça de prisão do Ministério Público ocorrem no mesmo dia em que o ex-diplomata apresentará, por vídeo, aos ministros das Relações Exteriores da União Europeia (UE) a situação na Venezuela após a polêmica eleição presidencial de julho.
— A situação na Venezuela é crítica — disse mais cedo o chefe de política externa do bloco, Josep Borrell, a repórteres em Bruxelas. — É por isso que convidei Edmundo [González], o candidato que apresentou resultados que mostram que Maduro não venceu esta eleição.
Borrell disse que a UE estava “muito preocupada com a situação dos líderes da oposição” na Venezuela, que viram membros da equipe “serem presos e desaparecerem”, além de denunciar a fuga de centenas de “comanditos” — seus ativistas e testemunhas eleitorais — em meio à repressão.
Não se esperava nenhuma decisão na reunião informal da UE, mas Borrell disse, no entanto, que esperava que os 27 estados-membros pudessem chegar a uma posição comum sobre o resultado da votação.
— Eu disse antes da reunião que acredito que claramente Maduro não pode ser reconhecido como um vencedor legítimo dessa eleição presidencial, mas vamos ver o que os ministros têm a dizer — disse Borrell.
A UE já se declarou “extremamente preocupada” com o agravamento da crise política na Venezuela. O bloco, juntamente com vários países latino-americanos e os Estados Unidos, pediram ao CNE que divulgasse os dados da votação que comprovam a reeleição de Maduro para um terceiro mandato de seis anos, até 2031.
— Temos de encarar a realidade de que essa prova não será fornecida, não há vontade de fazê-lo — disse o Ministro das Relações Exteriores da Espanha, José Manuel Albares, a repórteres em Bruxelas. — Está claro que, se os dados não forem divulgados, o resultado da eleição não poderá ser reconhecido.