Quando a guerra na Ucrânia começou, há dois anos, o presidente russo Vladimir Putin prometeu que os recrutas não seriam envolvidos no combate. Porém, com a dificuldade de Moscou em conter os recentes e inesperados avanços ucranianos em seu território, desde a semana passada, surgem relatos de que recrutas mal treinados foram colocados para defender a fronteira. Segundo uma reportagem da CNN, esse envio de recrutas, que receberam pouco treinamento e não estavam armados adequadamente, tem gerado indignação na Rússia, especialmente entre as mães e esposas dos soldados, que são uma voz influente no país.
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— Quando a fronteira foi atacada às 3 da manhã por tanques, havia apenas recrutas se defendendo — disse uma mulher que se identificou como apenas como Olga, mãe de um recruta em Kursk, em mensagem compartilhada no Telegram. — Eles não viram um único soldado, nem um único soldado contratado. Eles não viram ninguém. Meu filho ligou mais tarde e disse: “Mãe, estamos em choque”.
Segundo a reportagem, outras mães reportaram o desaparecimento de recrutas durante os ataques ucranianos na região, o que levou à circulação de uma petição on-line pedindo a retirada desses jovens das áreas de combate.
— O que os garotos poderiam fazer? Enfrentar [os soldados ucranianos] com uma pá? — disse Natalia Appel, avó de Vladislav, um recruta russo, ao veículo de notícias independente russo Verstka, citada na reportagem.
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Na Rússia, todos os homens saudáveis são obrigados a se alistar e servir um ano no Exército russo, se convocados. São dois recrutamentos anuais, na primavera e no outono (Hemisfério Norte), sendo chamados mais de 100 mil jovens em cada um. No ano passado, Putin ordenou que a idade de alistamento fosse aumentada em três anos, de modo que qualquer homem entre 18 e 30 anos poderia ser convocado. Evitar o alistamento é considerado crime, sujeito a pena de prisão.
Historicamente, o tratamento dos recrutas sempre foi uma questão sensível na Rússia, e a mobilização deles na guerra contra a Ucrânia já causou controvérsias anteriormente. Com um treinamento limitado, a Rússia depende desses recrutas para proteger suas longas fronteiras, mas sem esperar que eles sejam diretamente atacados. Contudo, com a incursão surpresa da Ucrânia, a situação mudou rapidamente, com os recrutas se vendo na linha de frente subitamente e sem preparo adequado para se defender.
De acordo com a reportagem, o Comitê Anti-Guerra do país, grupo formado por russos exilados, emitiu uma declaração nesta quarta-feira afirmando que “a ausência de qualquer unidade militar significativa da Federação Russa na fronteira no momento do ataque e a condução contínua de operações militares agressivas por mais de 900 dias no território da Ucrânia soberana é a melhor prova de que Putin está mentindo novamente sobre ‘proteger a Rússia.’ Ele não se importa com a Rússia, ele está apenas protegendo a si mesmo”.
A resposta russa ao avanço ucraniano em seu território envolveu o envio de tropas adicionais para a região de Kursk, desviando unidades de outras áreas ocupadas na Ucrânia e de outras partes da Rússia, disseram dois altos funcionários dos EUA à CNN.
No entanto, isso não impediu que alguns recrutas fossem capturados e feitos prisioneiros de guerra pelas forças ucranianas, como foi confirmado pelo próprio presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, no início da semana. Várias fotos e vídeos de homens aparentemente jovens foram divulgadas pelo Exército ucraniano, alegando ser prisioneiros de guerra russos.
A Ucrânia indicou na quinta-feira que controlava 1.150 km² e 82 cidades russas e, nesta sexta-feira, indicou que as suas forças fizeram novos avanços. A Rússia, por sua vez, indicou que esta incursão provocou a fuga de 120 mil pessoas.