Um ataque aéreo israelense no início deste sábado atingiu um complexo escolar no norte da Faixa de Gaza, onde milhares de palestinos deslocados estavam abrigados, matando ao menos 90 pessoas, entre elas 11 crianças e seis mulheres, de acordo com a Defesa Civil de Gaza. Os militares israelenses informaram que ao menos 19 combatentes do grupo terrorista Hamas foram mortos na operação, afirmando que a organização armada palestina estava usando o local na Cidade de Gaza para conduzir operações militares e ataques contra Israel. O ataque, que foi amplamente condenado internacionalmente, ocorre em meio ao temor de uma escalada regional e à pressão exterior para que as partes envolvidas no conflito cheguem a um consenso sobre um cessar-fogo.
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— O número de mortos está agora entre 90 e 100 e há dezenas de feridos. Três foguetes israelenses atingiram a escola que abriga palestinos deslocados — disse à AFP o porta-voz da organização, Mahmoud Basal. — Dezenas de pessoas ficaram feridas e algumas delas estão nos cuidados intensivos, há muitas partes de corpos não identificadas e pessoas desaparecidas.
O porta-voz disse inicialmente que cerca de 6 mil palestinos deslocados estavam abrigados no complexo — a escola al-Tabi’een e a mesquita adjacente, no distrito de al-Daraj —, mas depois mudou o número para mais de 2 mil. Tanto o serviço de emergência da Defesa Civil quanto o porta-voz do Ministério da Saúde de Gaza, Medhat Abbas, disseram que o ataque ocorreu enquanto mais de 200 pessoas se reuniam antes do nascer do sol, por volta das 4h30 locais, em um salão de orações para rezar. Este ataque “deveria fazer o mundo inteiro parar para pôr fim a esta guerra insana em Gaza”, disse Basal.
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O bombardeio — cujo número de vítimas não pôde ser verificado de forma independente — está entre os mais mortíferos desde o início da guerra no enclave palestino, desencadeada por um ataque do Hamas em solo israelense em 7 de outubro, segundo dados divulgados pelo próprio grupo, no poder em Gaza desde 2007.
Acredita-se que os números sejam confiáveis, embora, imediatamente após ataques específicos, eles possam ser difíceis de precisar, e a destruição do sistema de saúde do território tenha tornado os números mais difíceis de rastrear.
O Exército de Israel disse em comunicado que “pelo menos 19 terroristas do Hamas e da Jihad Islâmica foram eliminados” na operação, publicando nomes e fotos das pessoas apresentadas como os combatentes mortos. Eles confirmaram que usaram “três munições precisas” no ataque e que “nenhum dano grave foi causado ao complexo”.
O Hamas, por sua vez, rejeitou as alegações israelenses de que o local era um esconderijo do grupo, denunciando um “crime horrível” e uma “escalada perigosa” depois de Israel ter concordado na sexta-feira, sob pressão internacional, em retomar as negociações sobre uma trégua no enclave palestino em 15 de agosto. “Os militares inimigos inventam desculpas para atacar civis, escolas, hospitais e as tendas dos deslocados”, disse o Hamas em um comunicado horas depois.
O Hezbollah, aliado libanês do grupo palestino, chamou o ataque de “massacre horrível”. O Irã, que apoia ambos os grupos e acusou Israel de querer espalhar a guerra no Oriente Médio após os assassinatos de alto perfil em Teerã e Beirute, condenou o que chamou de “ataque bárbaro”.
Com quase todos os 2,4 milhões de habitantes da Faixa de Gaza deslocados pelo menos uma vez durante a guerra, muitos buscaram refúgio em prédios escolares, que foram atingidos pelo menos 14 vezes desde 6 de julho, de acordo com uma contagem da AFP.
Grupos de resgatistas recolhiam os corpos ensanguentados em um prédio destruído para depois transportá-los em várias ambulâncias, de acordo com imagens da AFP. No momento do bombardeio, “as pessoas na escola estavam rezando”, lembrou um socorrista que preferiu não dar seu nome, afirmando ter descoberto “corpos amontoados uns sobre os outros”.
“Estamos profundamente preocupados com os relatos de vítimas civis em Gaza” após o ataque, disse o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, Sean Savett, em um comunicado, acrescentando que os EUA estavam “pedindo mais detalhes”. Ele disse que o ataque, que gerou condenação internacional, “ressalta a urgência de um cessar-fogo e de um acordo sobre reféns, pelos quais continuamos trabalhando incansavelmente”.
Por sua vez, a relatora especial das Nações Unidas para os Territórios Palestinos, a italiana Francesca Albanese, acusou Israel de “genocídio dos palestinos”, e o Catar pediu uma “investigação internacional urgente” sobre o ocorrido.
A Arábia Saudita também condenou o ataque e pediu o fim dos massacres em Gaza. O Ministério das Relações Exteriores da Turquia denunciou “um novo crime contra a Humanidade”, e o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã condenou um “crime de guerra”.
O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, disse estar “horrorizado”, e o Ministério das Relações Exteriores da França lembrou que o “respeito ao direito internacional humanitário é obrigatório para Israel”.
Após mais de dez meses de guerra, as tropas israelenses continuam combatendo o grupo palestino, considerado uma organização “terrorista” por Israel, Estados Unidos e União Europeia.
O Exército israelense indicou na sexta-feira que suas tropas estavam combatendo o grupo na área de Khan Younis, a grande cidade do sul de Gaza que foi destruída. O exército havia pedido à população que evacuasse os bairros do leste da localidade.
Reinício das negociações?
O conflito intensificou drasticamente a tensão no Oriente Médio, especialmente após as mortes do líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, em Teerã, e de um comandante do movimento islâmico libanês Hezbollah em Beirute. Israel reivindicou apenas o segundo desses ataques, mas tanto o Hamas quanto o Irã acusam Israel também pela morte de Haniyeh e prometeram vingança.
Diante da possibilidade de uma escalada regional, Catar, Egito e Estados Unidos instaram ambas as partes, na quinta-feira, a retomar as negociações indiretas para um cessar-fogo e a libertação dos reféns capturados pelo Hamas em seu ataque de outubro.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, acusado por opositores, analistas externos e pelo próprio Hamas de querer prolongar a guerra para obter vantagens políticas, aceitou participar dessas novas conversas. Por outro lado, o Hamas, que nomeou Yahya Sinwar como seu novo líder esta semana, ainda não deu sua resposta.
Sinwar é apontado por Israel como o principal estrategista do ataque de 7 de outubro, que desencadeou o conflito. Os combatentes do Hamas mataram, naquele dia, 1.198 pessoas, a maioria civis, e capturaram outros 251 como reféns, segundo dados israelenses. No entanto, o Exército israelense estima que 111 reféns ainda permanecem em Gaza, incluindo 39 que são dados como mortos. Em retaliação, Israel prometeu acabar com o Hamas e lançou uma campanha militar contra Gaza, que já resultou na morte de 39.790 pessoas, segundo o Ministério da Saúde deste território. (Com AFP e NYT.)