Com ofensivas russas avançando a passos largos no leste, Zelensky cobra mais pressa de seus aliados no fornecimento de armas e equipamentos militares, além da permissão para atingir alvos russos distantes da fronteira. Em seu discurso na Assembleia-Geral da ONU, na quarta-feira, disse que Moscou planejava atacar suas usinas nucleares e criticou uma proposta de paz, defendida por China e Brasil, que quer iniciar negociações entre Kiev e Moscou para um cessar-fogo.
Antes do encontro, a Casa Branca anunciou, em comunicado, a liberação de quase US$ 8 bilhões em ajuda militar, incluindo através de sistemas de defesa Patriot, usados para conter os ataques aéreos russos, além de munições e treinamento para manejar os caças F-16, cujo uso foi autorizado por Washington.
“Por quase três anos, os Estados Unidos reuniram o mundo para ficar ao lado do povo da Ucrânia enquanto defende sua liberdade da agressão russa, e tem sido uma das principais prioridades da minha administração fornecer à Ucrânia o apoio de que ela precisa para prevalecer”, diz Biden, em comunicado. “Nesse período, a Ucrânia venceu a batalha de Kiev, recuperou mais da metade do território que a Rússia tomou no início da guerra e protegeu sua soberania e independência. Mas há mais trabalho a ser feito.”
Diante dos jornalistas e ao lado de Zelensky, na Casa Branca, Biden reiterou que, para ele, “a Rússia não vencerá”.
— A Ucrânia vencerá e continuaremos a apoiá-la em cada passo do caminho — afirmou o presidente americano, antes de as portas serem fechadas para o início da reunião.
Em declarações ao lado de Zelensky, Kamala Harris reiterou o apoio à Ucrânia, e aproveitou para criticar indiretamente seu rival em novembro, Donald Trump, que sinalizou ser favorável a uma solução rápida para o conflito, possivelmente com o congelamento das linhas de frente atuais.
— Alguns em meu país forçariam a Ucrânia a abrir mão de grandes partes de seu território soberano, que exigiriam que a Ucrânia aceitasse a neutralidade e exigiriam que a Ucrânia renunciasse às relações de segurança com outras nações — disse Kamala. — Essas propostas são as mesmas de Putin, e sejamos claros, elas não são propostas de paz, Em vez disso, são propostas de rendição, o que é perigoso e inaceitável.
Segundo a imprensa americana, o líder da Ucrânia apresentou a Biden e a Kamala o que considera ser um “plano de vitória” para derrotar as forças russas, no momento em que a guerra se aproxima de mil dias. Contudo, aponta o Wall Street Journal, a proposta não traz grande novidades e se pauta pela pressão sobre Biden para que libere o uso de armas ocidentais em ataques mais profundos em território russo, algo que a Casa Branca não parece disposta a fazer em curto prazo.
Mais do que buscar mais apoio a seus esforços de guerra, Zelensky também chega à capital americana em busca de sinais sobre o futuro: mais especificamente, sobre o que acontecerá após a eleição presidencial de novembro. E as perspectivas, assim como o resultado da disputa entre Kamala e Trump, estão longe de serem claras.
O campo republicano está cada vez mais avesso a manter a bilionária ajuda militar a Kiev, e Trump tem repetido que, caso seja eleito, vai colocar um ponto final à guerra antes mesmo de ser empossado. Para Zelensky e seus assessores, as falas acendem sinais de alerta para o risco de o ex-presidente aceitar os argumentos do líder russo, Vladimir Putin, para congelar o conflito nas atuais linhas antes de dar início a negociações de paz.
— Qualquer acordo, o pior acordo, teria sido melhor do que o que temos agora. Se eles [Ucrânia] tivessem feito um acordo ruim, teria sido muito melhor. Eles teriam concedido um pouco, e todo mundo estaria vivendo e cada prédio seria construído e cada torre envelheceria por mais 2.000 anos — disse Trump, em discurso de campanha na Carolina do Norte, na quarta-feira. — Que acordo podemos fazer? Está tudo demolido. As pessoas estão mortas. O país está em escombros.
Além de criticar Biden por fornecer bilhões em ajuda a Kiev, “como nenhum país viu antes”, Trump também expressou descontentamento com alguns comentários de Zelensky à revista New Yorker, nos quais chamou o vice republicano, J.D. Vance, de “radical demais” e afirmou que o ex-presidente “não sabe realmente como parar a guerra”.
— É algo sobre o qual precisamos ter uma conversa rápida de por que o presidente da Ucrânia está em nosso país e faz pequenas insinuações desagradáveis em relação ao seu presidente favorito, eu — disse Trump na Carolina do Norte. Um dia antes, na Geórgia, disse que Zelensky era o “maior vendedor do mundo”, uma vez que, segundo ele, toda vez que vai aos EUA volta à Ucrânia com “US$ 100 bilhões”.
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Enquanto o líder ucraniano estava na Casa Branca, Trump publicou em sua rede social, o Truth Social, uma mensagem de Zelensky com um pedido de encontro com o republicano — no texto, ele diz que sempre se refere “com grande respeito” sobre Trump e argumenta que os dois “precisam se esforçar para entender um ao outro e permanecer em contato próximo”. No começo da noite, o ex-presidente confirmou que receberá Zelensky na Trump Tower, em Nova York, na sexta-feira, sem revelar a pauta do encontro, tampouco se ele ocorrerá em clima amistoso.
Antes de ir à Casa Branca, Zelensky esteve no Capitólio, mas as principais lideranças republicanas não se esforçaram para recebê-lo, incluindo o presidente da Câmara, Mike Johnson.
Na quarta-feira, Johnson, defendeu a remoção da embaixadora ucraniana nos EUA por causa de uma visita de Zelensky no domingo a uma fábrica de armas na Pensilvânia, um dos sete estados que devem decidir as eleições de novembro. Na ocasião, o presidente da Ucrânia estava acompanhado por vários políticos democratas e chegou a assinar munições de artilharia, algo que, para o deputado, teve claro intuito eleitoral.
“A visita foi claramente um evento de campanha partidária projetado para ajudar os democratas e é claramente uma interferência eleitoral”, escreveu Johnson em uma carta a Zelensky, na qual defendeu a saída da embaixadora Oksana Markarova. Kiev ainda não respondeu, e o Exército afirmou, em nota à Associated Press, que não houve irregularidade e que é comum visitas do tipo contarem com a presença de políticos locais. A Casa Branca disse que a visita foi iniciativa dos próprios ucranianos, rejeitando a versão de que teria sido um ato político.