Depois de o premier Benjamin Netanyahu fazer um discurso desafiador na Assembleia Geral da ONU declarando que Israel tem o direito de acabar com a ameaça representada pelo grupo xiita libanês Hezbollah, o Exército israelense bombardeou nesta sexta-feira prédios residenciais na região sul de Beirute, afirmando que o quartel-general da organização estava em seu subterrâneo e que a ação tinha como alvo o líder máximo do movimento xiita, Hassan Nasrallah. Horas depois, Israel voltou a atacar a região para atingir o que descreveu como depósitos de armas sob construções civis, o que o grupo xiita negou ser verdade. Os novos ataques também foram direcionados à área de Tiro, no sul do país, onde Israel diz ter matado o comandante da unidade de mísseis do Hezbollah na região, seu adjunto e outros chefes do movimento armado próximo do Irã.
De acordo com o Ministério da Saúde libanês, os ataques em Dahiyeh deixaram seis mortos e 100 feridos — fontes ligadas ao Hezbollah, porém, indicaram que Nasrallah não está entre as vítimas, afirmando que ele “está bem”. Autoridades de Defesa israelense, porém, disseram ao jornal Haaretz que estimam o número de mortos em 300. Após o ataque em Beirute, o Hezbollah lançou foguetes contra a cidade israelense de Safed, na Galileia, atingindo duas casas sem deixar feridos. Antes, Israel registrou o lançamento de um total de 65 foguetes vindos do Líbano.
“Sobre o ataque aos subúrbios do sul de Beirute: confirmamos que [Hassan] Nasrallah estava no quartel-general visado, depois o Exército lançou bombas que penetraram nos bunkers”, afirmou a Rádio do Exército israelense em uma publicação em sua conta no X. Ainda não está claro, porém, se Nasrallah estava efetivamente nos prédios no momento em que foram atingidos em Dahiyeh, uma área densamente povoada de Beirute que é considerada reduto do Hezbollah e que foi alvo de ao menos outros dois ataques desde a semana passada. Na terça, Israel matou o chefe da unidade de mísseis do Hezbollah, Ibrahim Qubaisi, e há uma semana matou Ibrahim Aqil, que era chefe das operações militares do Hezbollah e comandante interino da força de elite Radwan.
— O quartel-general central do Hezbollah foi intencionalmente construído sob prédios residenciais no coração de Dariyeh, em Beirute, como parte da estratégia do Hezbollah de usar o povo libanês como escudo humano — afirmou o principal porta-voz militar israelense, Daniel Hagari, em um pronunciamento no começo da tarde desta sexta.
Exército de Israel diz ter bombardeado quartel-general do Hezbollah no subúrbio de Beirute
No fim da noite (madrugada de sábado em Israel), aviões de combate israelenses mataram Mohamed Ali Ismail, apresentado como o comandante dessa unidade, e seu adjunto, Hossein Ahmed Ismail, publicou o Exército no Telegram. “Outros comandantes do Hezbollah e terroristas foram eliminados ao mesmo tempo”, acrescentou. Na capital libanesa, os ataques prosseguiram ao longo da madrugada no horário local, atingindo edifícios no sul da cidade, onde Israel alega que” estão instalações de produção de armas, edifícios usados para armazenar armas avançadas e centros de comando importantes” do Hezbollah.
— Não se pode ignorar a cumplicidade dos Estados Unidos nos crimes — disse o chefe da diplomacia iraniana, Abbas Araghchi, durante reunião do Conselho de Segurança dedicada a analisar a situação palestina, citando o apoio militar de Washington a Israel.
Ele também rechaçou as “ameaças ultrajantes” do primeiro-ministro israelense em seu discurso na ONU.
Já Ali Larijani, conselheiro do líder supremo do Irã, Ali Khamenei, afirmou à TV estatal iraniana que “os assassinatos não resolverão os problemas de Israel… a resistência tem líderes e quadros fortes, e todo líder martirizado será substituído”, referindo-se ao “Eixo da Resistência”, uma aliança informal liderada por Teerã entre países e movimentos extremistas islâmicos espalhados pelo Oriente Médio. Os integrantes compartilham entre si a oposição à influência do Ocidente na região e à existência do Estado de Israel. Embora a maioria dos grupos seja de maioria xiita, como o Hezbollah, o grupo terrorista Hamas, sunita, e o regime alauíta de Bashar al-Assad, na Síria, também integram a formação.
Em seu discurso na ONU, em que afirmou que Israel prosseguirá com os ataques contra o Hezbollah até que os objetivos traçados (o retorno da população civil ao norte de Israel) sejam atingidos, Netanyahu se dirigiu diretamente ao Irã, ameaçando retaliar qualquer ação contra o Estado judeu.
— Tenho uma mensagem para os tiranos em Teerã: se vocês nos atacarem, nós vamos atacar vocês. Não há um lugar no Irã que Israel não possa atingir, e isso vale para todo o Oriente Médio — afirmou o premier israelense, que antecipou sua volta de Nova York para Israel para a noite desta sexta.
O Gabinete do premier divulgou uma foto do momento em que ele teria autorizado o bombardeio contra a posição do Hezbollah, do hotel em que está hospedado nos EUA. Na foto, é possível vê-lo falando em um telefone com fio. Parte da imagem está propositalmente manchada, possivelmente para não comprometer o modelo de equipamentos de segurança utilizados pelo líder israelense para fazer chamadas. O Pentágono divulgou uma nota afirmando que os EUA não tinham envolvimento ou conhecimento prévio da ação.
Quatro prédios dizimados
O ministro libanês da Saúde, Firass Abiad, disse que os ataques “dizimaram completamente” quatro de seis prédios e que o número de vítimas nos hospitais ainda era baixo porque muitas pessoas estavam sob os escombros.
— Esses são prédios residenciais. Estavam cheios de pessoas — afirmou Abiad em uma entrevista ao New York Times. — Quem quer que estivesse neles agora está sob os destroços.
Os ataques aconteceram perto das 18h20 locais (12h20 em Brasília) muito perto de uma escola onde pessoas deslocadas do sul do Líbano estão abrigadas. Segundo um relato de uma repórter da BBC, no início todos pensaram que os barulhos de explosão fossem jatos israelenses quebrando a barreira do som. Mas, como os estrondos continuaram, as pessoas começaram a correr para fora do prédio em pânico. Algumas desmaiaram e caíram no chão. As explosões foram tão fortes que as colunas de fumaça puderam ser vistas em cidades a uma hora de distância de Beirute.
Israel ataca quartel-general do Hezbollah em Beirute
Investida israelense realizada na sexta-feira (27) teria como alvo o líder do grupo no Líbano
Uma descrição feita por um repórter do jornal New York Times afirma que o barulho foi ensurdecedor, e que uma fumaça preta e espessa pôde ser vista subindo no horizonte.
— Foi como o Dia do Juízo Final. Não consigo descrever — disse Hussein Awada, de 54 anos, que estava no bairro de Borj al-Brajneh quando as explosões enviaram ondas de choque e fumaça pelas ruas ao redor.
Ao se manifestar sobre os ataques, o primeiro-ministro libanês, Najib Mikati, afirmou que a ação prova que o Estado judeu “não dá a mínima atenção aos esforços e apelos internacionais por um cessar-fogo”. Mikati também fez um apelo à comunidade internacional para que pressione Israel por uma trégua.
O secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, afirmou em um pronunciamento que “uma guerra total deveria ser evitada”, enquanto o secretário-geral da ONU, António Guterres, e o chanceler russo, Serguei Lavrov, fizeram alertas de que esse risco está cada vez mais próximo. Em conversa com jornalistas às margens da Assembleia Geral da ONU, o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, lamentou que a pressão exercida sobre Netanyahu não tenha diso capaz de interromper a ofensiva.
— O que fazemos é exercer toda a pressão diplomática para um cessar-fogo, mas ninguém parece capaz de deter Netanyahu, nem em Gaza nem na Cisjordânia — disse Borrell, citado pela AFP. — Se a interpretação de “destruí-los” (Hezbollah) for a mesma que a do Hamas, então iremos para uma longa guerra.
A coordenadora especial da ONU para o Líbano, Jeanine Hennis, se disse “profundamente alarmada” e “profundamente preocupada” com o potencial impacto civil dos ataques em Beirute, destacando que ocorreram em áreas densamente povoadas.
Em seu comunicado, Hagari afirmou que Israel “está fazendo o que todos os Estados soberanos do mundo fariam” ao tomar as “medidas necessárias” para proteger o próprio povo.
O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas israelenses, o tenente-general Herzi Halevi, elogiou o que descreveu como “alto nível de prontidão no ataque e na defesa em todas as frentes”. Yoav Gallant, o ministro da Defesa, observou o ataque da sala de comando subterrânea da Força Aérea Israelense, segundo seu gabinete.