— Existem fortes indícios de que o crime organizado está infiltrado no poder público. E nós, com esses agentes da segurança, vamos ajudar a sanear o poder público de São Paulo dessa gente que é ladra, que é máfia, que mata e não dá a você o direito de ir e vir, de trabalhar, de pegar um transporte coletivo sem saber para quem está pagando. Se é para o PCC ou para essa prefeitura — disse o apresentador.
Datena afirmou ainda que não deseja que São Paulo e o Brasil virem um “narcoestado” e se mostrou contrário à polarização entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na eleição paulistana. Segundo ele, os dois colocaram “marionetes” para disputar o governo da cidade, em referência ao deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) e ao prefeito Ricardo Nunes (MDB). Declarou, porém, contar com o voto de apoiadores de ambos que não querem eleger seus apadrinhados.
Apesar do desejo de ganhar votos do eleitorado de Boulos, o discurso de Datena foi praticamente inteiro voltado a críticas a Nunes, que não considera ter a “legitimidade” de Bruno Covas, prefeito eleito pelo PSDB em 2020 e falecido no ano seguinte. Além das suspeitas de envolvimento do crime organizado em empresas contratadas pela prefeitura, o tucano criticou medidas “eleitoreiras” como a tarifa zero aos domingos no transporte público e a quantidade de obras emergenciais, contratadas sem licitação.
‘Vou sair pela porta da frente’
Em uma convenção marcada por protestos, o candidato tucano acusou o prefeito Ricardo Nunes (MDB) de financiar “baderneiros” para atrapalharem o evento. Grupo tucano contrário à indicação de Datena e favorável ao apoio a Nunes colocou desde cedo um equipamento na entrada da Assembleia Legislativa do Estado (Alesp) reproduzindo frases críticas do jornalista a integrantes do PSDB, como o ex-governador mineiro Aécio Neves.
Os militantes tiveram a entrada barrada no auditório, com auxílio da Polícia Militar. Do lado de fora, um carro de som cobrava um “debate” entre Datena e o ex-presidente do diretório municipal do partido Fernando Alfredo e chamava José Aníbal, atual ocupante do cargo, de “golpista”. Centenas de pessoas se aglomeraram em frente ao portão principal e discutiram com o apresentador de TV, que fez questão de sair “pela porta da frente”.
Antes de deixar o local, Datena chamou os manifestantes de “canalhas”, “vagabundos” e “filhos da p***”, com o dedo em riste. O grupo dissidente respondeu com gritos de “arregão” e cercou o carro do apresentador, que conseguiu sair do estacionamento com o auxílio de um cordão humano da Polícia Militar.
— De onde veio o dinheiro para financiar essa gente toda que está aí fora? Quem deu dinheiro para carro de som, para baderneiro? — questionou Datena, durante a convenção partidária. — Tem que ser investigada pela Polícia, pelo Ministério Público, para que essas eleições não sejam sangrentas, pregadas numa polarização que não leva a lado nenhum.
No discurso, Datena também disse “confiar” no governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) para que não interfira em investigações da polícia e do Ministério Público e declarou considerar “boa pessoa” o vice de Nunes, o coronel da reserva da Polícia Militar (PM) Ricardo Mello Araújo (PL), seguidor fiel de Bolsonaro e indicado diretamente por ele para a chapa.
— A sorte dele (Ricardo Nunes) é que não vai ser eleito, porque seria o primeiro caso de o vice prender o prefeito — alfinetou o apresentador.
A jornalistas que acompanhavam a entrada do apresentador na Alesp, Datena fez mais referências à suposta infiltração do PCC nos serviços de ônibus da capital e insinuou que o grupo tucano que protestou contra a sua candidatura poderia ter ligações com o crime organizado.
— Nós temos que devolver ao povo o transporte coletivo, para que o povo não pague para andar em ônibus do PCC. E nem sei se tem gente do PCC misturada aqui, fazendo baderna e quebrando vidro (na convenção) — ele afirmou. — É por isso que nós queremos chegar à prefeitura de São Paulo, botar essa gentalha, que existe aí em favor do crime organizado, na cadeia.
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Em abril, uma operação do Ministério Público de São Paulo teve como alvo duas organizações suspeitas de lavar dinheiro para o PCC por meio do transporte público na capital paulista. O esquema envolve duas empresas de ônibus, a UPBus e a Transwolff, que transportam quase 700 mil pessoas por dia e receberam quase R$ 800 milhões em remuneração da Prefeitura. Dias depois, Nunes esteve na garagem da UPBus para parabenizar a empresa.
José Aníbal anunciado como vice
Dentro do auditório, a convenção municipal correu sem atritos. Datena teve o nome aprovado pela direção nacional da federação PSDB-Cidadania ainda na sexta-feira, 26. Coube a ele também apresentar o ex-senador José Aníbal, presidente do diretório municipal tucano na capital, como candidato a vice. O anúncio pegou os presentes de surpresa, segundo relatos, e a ata da convenção precisou ser atualizada antes da sua leitura final.
Serão ainda 53 candidatos a vereador em São Paulo, com 43 do PSDB e 10 do Cidadania. O partido tenta retomar a bancada na Câmara Municipal depois de assistir a todos os seus oito parlamentares pedirem desfiliação na janela partidária, em abril, descontentes com a falta de acerto com o atual prefeito para as eleições de 2024.
José Aníbal, presidente do diretório municipal do PSDB na capital paulista, minimizou a confusão dos “camisas pretas” e reafirmou declaração dada ontem ao GLOBO de que medidas legais serão tomadas contra os envolvidos. O candidato a vice afirmou ainda que “nenhum outro candidato” tem a popularidade de Datena e convocou os postulantes a vereador a fecharem com ele.
— Comecem a campanha, mas junto com o Datena. Esse será o melhor caminho para vocês conquistarem o voto.
O presidente da Federação PSDB-Cidadania e ex-vereador Mário Covas Neto, criticou os manifestantes liderados por Alfredo e relembrou um episódio em que o ex-governador Mário Covas foi impedido de entrar em um evento na Secretaria de Educação.
— Para entrar aqui me agarraram, me puxaram, fizeram de tudo. Pensei, olha, estou revivendo o passado. É muito triste isso – disse Covas Neto.
Ele aproveitou o momento para rebater a afirmação de que o PSDB teria “acabado” depois da ascensão do PL e o fim da polarização com o PT de Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo ele, um partido que acabou não é capaz de gerar aquela disputa.
— Espero que o pessoal que está protestando esteja com a gente em outro momento. Muitos não vão estar…
— Porque acabou a mamata — completou Datena, arrancando risos da plateia.
O presidente nacional do PSDB, Marconi Perillo, defendeu a candidatura de Datena como uma alternativa para os “extremos”, segundo ele, representados por Boulos e Nunes. Para ele, o PSDB é uma “grife” para o candidato, porque “deixou legados irreversíveis em todos os estados” que governou ao longo de sua história. Admitiu, por outro lado, que “não será uma eleição fácil”.
— Esses que estão desesperados, pagos pelo erário público, até ontem não acreditavam que o Datena seria candidato — disse Perillo. — Saímos daqui para a rua com um candidato de peso, que tem coragem e resiliência e entra para ganhar. Está aí a origem do desespero, da preocupação.