Várias pessoas próximas ao presidente dos EUA, Joe Biden, afirmaram ao New York Times nesta quinta-feira que ele começou a aceitar melhor a ideia de que pode não ser capaz de vencer as eleições em novembro, cedendo às crescentes pressões de membros do Partido Democrata para que deixe a corrida pela Casa Branca. Rumores apontam que desistência pode acontecer no domingo, 21.
Segundo jornalistas americanos que cobrem a Casa Branca, Biden não deve renunciar ao cargo como presidente e terminará o mandato, mas abriria mão da disputa contra o ex-presidente Donald Trump. Embora a vice-presidente Kamala Harris seja a principal cotada para substituí-lo, especula-se que, em caso de desistência, a Convenção Nacional Democrata permita que outros candidatos também possam ser votados à cabeça de chapa.
Desde que as pressões começaram após sua participação desastrosa em um debate contra Trump há três semanas, Biden vinha repetindo que nada o faria deixar a disputa. Mas, na quarta-feira, pouco antes de ser diagnosticado com Covid-19, ele deu o primeiro sinal de reconsiderar a posição ao afirmar publicamente que poderia abandonar a corrida por motivos de saúde. Segundo um aliado, “a realidade está se impondo” e que não seria uma surpresa se Biden anunciasse em breve seu endosso a Kamala.
A informação é baseado em entrevistas com quatro pessoas próximas ao presidente, todas descrevendo a situação como extremamente delicada e falando sob condição de anonimato. No momento, Biden está isolado em sua casa de férias em Rehoboth Beach, no estado de Delaware.
Democratas mais distantes da Casa Branca também disseram que estavam aumentando as expectativas dentro do partido de que Biden logo cederia — uma mudança em relação a poucos dias atrás, quando os partidários pareciam desesperados em fazê-lo mudar de ideia. No entanto, houve também uma cautela entre eles para conseguir ler os sinais de um presidente com um círculo extremamente pequeno de confidentes.
O último democrata de destaque a pedir publicamente ao presidente que considerasse passar a tocha para outro candidato foi o deputado Jamie Raskin, de Maryland, um membro importante do comitê da Câmara que investigou o ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021. Uma carta que ele enviou a Biden em 6 de julho, divulgada pelo The New York Times nesta quinta-feira, comparou o presidente de 81 anos a um arremessador de beisebol cansado e o exortou a consultar os colegas democratas sobre a continuidade de sua campanha. “Tudo em que acreditamos está em jogo nos próximos quatro meses e meio”, escreveu Raskin.
Autoridades da Casa Branca negaram que o presidente estivesse cogitando a desistência, classificando os comentários como resultado de uma campanha coordenada para aumentar a pressão sobre Biden. Embora tenham dito que Biden está ouvindo as preocupações e levando-as a sério, afirmam que ele não mudou de ideia e deixou claro para assessores nas últimas 24 horas que continua determinado a permanecer na disputa.
Mike Donilon, conselheiro sênior de longa data de Biden e um de seus confidentes mais leais, disse ao presidente que a corrida continua competitiva, apesar das dúvidas dos democratas e de algumas pesquisas, insistindo que ainda há um caminho para a vitória, de acordo com outros conselheiros. A família do presidente também o tem apoiado, observando sua longa história de superação.
Orgulhoso e teimoso, Biden mantém uma lista mental de todas as vezes em que foi bem-sucedido depois de ter ouvido que não conseguiria e, quanto mais é pressionado, mas tende a se manter firme em suas decisões. No entanto, as crescentes exigências para que ele se afaste agora não vêm apenas de estrategistas auxiliares ou de comentaristas da imprensa, mas de democratas que foram seus aliados mais importantes nos últimos anos. Para um presidente que sempre valorizou seus relacionamentos no Capitólio, isso é o reflexo do fundo do poço.
Compreendendo como sua mente funciona e sensíveis à sua doença atual, várias pessoas familiarizadas com as discussões disseram que os aliados mais próximos a Biden estão hesitantes em pressioná-lo por uma resposta enquanto se recupera da covid. Nesta quinta-feira, seu médico disse que ele não está com febre, mas apresenta sintomas respiratórios.
As deliberações de Biden ocorreram em um momento de escalada da crise na sua campanha: pesquisas apontam doadores abandonando sua chapa, além de derrotas em muitos estados-chave no campo de batalha eleitoral.
A deputada Nancy Pelosi, da Califórnia, ex-presidente da Câmara dos Deputados e uma das mais leais apoiadoras do presidente, confessou a Biden que está pessimista em relação às suas chances, valendo-se do seu conhecimento no mapa político, nos dados de pesquisas e de arrecadação de fundos como instrumento de pressão.
Em uma ligação recente, quando Biden insistiu que havia pesquisas que mostravam que ele poderia vencer, Pelosi disse “coloque Donilon [ex-conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos] no telefone”, para que ela pudesse citar suas próprias pesquisas que mostravam o contrário — um desafio direto ao presidente, implicando que ele não está totalmente informado.
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Questionando, um porta-voz de Pelosi não negou que ela tenha compartilhado com o presidente dados que mostravam que ele não poderia vencer.
— A presidente Pelosi respeita a confidencialidade de suas reuniões e conversas com o presidente dos Estados Unidos — disse o porta-voz. — Infelizmente, o frenesi da imprensa, baseado em fontes anônimas, deturpa qualquer conversa que a presidente possa ter tido com o presidente.
Nesta quinta-feira, a vice-presidente Kamala Harris viajou para a Carolina do Norte para um comício de campanha no qual defendeu o segundo mandato de Biden. Andrew Bates, porta-voz da Casa Branca, negou que o presidente deixaria a disputa para dar lugar a Kamala ou a outro democrata.
— O presidente disse a ambos os líderes que ele é o candidato do partido, que planeja vencer e que espera trabalhar com ambos para aprovar sua agenda de 100 dias para ajudar as famílias trabalhadoras — disse Bates.
Até o momento, apenas 21 parlamentares democratas se manifestaram publicamente a favor da saída Biden, mas muitos reconheceram em particular que ele deveria desistir. Embora inicialmente as conversas tivessem sendo tratadas em segredo, o teor delas tem se tornado cada vez mais aberto um sinal da impaciência crescente nas fileiras da sigla diante das recusas do presidente.
O líder da bancada democrata no Senado, Chuck Schumer, e o líder da minoria democrata na Câmara, Hakeem Jeffries, disseram a Biden em particular na semana passada que os parlamentares estão profundamente preocupados com o destino das suas próprias candidaturas caso Biden continuasse na disputa, segundo duas pessoas familiarizadas com as conversas.
Nesta quinta, o clima dentro da Casa Branca e na sede da campanha do presidente em Wilmington, em Delaware, piorava à medida em que nossos acontecimentos se desenvolviam ao longo do dia.
Joe Scarborough, apresentador do programa “Morning Joe” da MSNBC e um dos maiores apoiadores de Biden, praticamente pediu que ele desistisse da disputa. Citando pesquisas que mostram que os democratas enfrentam dificuldades em estados importantes e avisos de doadores de longa data de que o apoio a Biden secou, Scarborough declarou que era hora dos seus aliados próximos “darem um passo à frente neste momento e ajudarem o presidente, ajudarem o homem que amam e fazerem a coisa certa”.
— Isso não vai acabar bem se continuar se arrastando [na disputa] — disse.
Na Casa Branca e na campanha de Biden, os membros da sua equipe estão cada vez mais preocupados com a possibilidade de Biden perder a Virgínia, sólido estado democrata há duas décadas que não era considerado que um campo de batalha importante na corrida presidencial.
Segundo um assessor sênior de Biden, há a sensação dentro das equipes de que a saída de Biden está começando a parecer inevitável — uma questão de quando e como, não de se. As conversas eram tabu até alguns dias atrás, disse a fonte em anonimato.
Por outro lado, Quentin Fulks, vice-diretor de campanha de Biden, negou que o presidente estivesse mais receptivo a pedidos para sair da disputa.
— Nossa campanha não está trabalhando em nenhum cenário em que Biden não esteja no topo da cédula de votação — disse Fulks nesta quinta-feira.
No entanto, desde semana passada a campanha democrata vem testando discretamente, em pesquisas de opinião, os cenários de uma eventual disputa entre Kamala e Trump.