— Na minha opinião, pelo menos, o sucesso é uma Ucrânia forte e independente, cada vez mais integrada às instituições atlânticas como a União Europeia, como a Otan, e que seja capaz de se manter de pé, militarmente, economicamente, democraticamente — afirmou Blinken, durante um evento paralelo à cúpula, em Washington. — O fato de a Otan também defender que a Ucrânia siga, de forma irreversível, no caminho à adesão, e que ela continue com as reformas, são garantias firmes de que as mudanças que o povo ucraniano tanto apoia continuarão e se aprofundarão.
A expressão estava presente no comunicado emitido pelos líderes nesta quarta-feira, intitulado “Declaração de Washington”: no texto, os países dizem que continuarão a apoiar a Ucrânia “em seu caminho irreversível para a plena integração euro-atlântica, incluindo a adesão à Otan”, além de prometerem uma ajuda de pelo menos € 40 bilhões (R$ 234,59 bilhões) no próximo ano. O comunicado reiterou a necessidade da aliança reforçar suas defesas e cooperação militar, defendendo que todos membros elevem seus gastos com defesa para pelo menos 2% do PIB, e expressou preocupação com a aliança cada vez mais estreita entre a Rússia e a China.
“As ambições declaradas e as políticas coercivas da República Popular da China continuam a desafiar os nossos interesses, segurança e valores. O aprofundamento da parceria estratégica entre a Rússia e a China, e as suas tentativas de reforço mútuo para minar e remodelar a ordem internacional são motivo de profunda preocupação”, afirmam os países da Otan, que tambem citaram o Irã como um agente “desestabilizador”.
Bombardeio russo atinge maior hospital infantil da Ucrânia e deixa 31 mortos
Contudo, há uma diferença entre “irreversível” e “imediato”, como deixaram claro os representantes da aliança. Em discurso na terça-feira, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, afirmou que uma eventual entrada da Ucrânia não seria imediata, e só aconteceria depois do fim da guerra com a Rússia.
— Acredito que, quando os combates cessarem, precisamos garantir que a Ucrânia tenha as capacidades para impedir agressões futuras da Rússia, e eles precisam de garantias de segurança — disse Stoltenberg.
Para que um país seja aceito, a Otan estabelece que ele tenha um sistema político democrático e funcional, baseado em uma economia de mercado; que ofereça um tratamento justo a minorias; um compromisso com a resolução pacífica de conflitos; a capacidade de contribuir com operações militares; e um compromisso com as relações e estruturas institucionais. Além da aprovação unânime dos demais membros.
Mesmo antes da guerra, quando a adesão à Otan era uma possibilidade distante, a Ucrânia tinha um longo caminho para percorrer até cumprir todos os requisitos. Segundo a ONG Freedom House, o país é classificado como “parcialmente livre”, com graves problemas institucionais, políticos e de corrupção enraízada e espalhada pelo Estado. As reformas citadas por Blinken estão ocorrendo, como afirmam ONGs de monitoramento internacionais, mas ainda em um ritmo lento, especialmente por causa das dificuldades da guerra.
Militarmente, as Forças Armadas ainda usam equipamentos de matriz soviética, e apesar do envio maciço de armas do Ocidente, elas ainda são uma pequena parcela do arsenal ucraniano. Para que itens como sistemas de defesa aérea e veículos fossem empregados nas linhas de frente, militares precisam de treinamentos, por vezes longos, que atrasam seu uso contra os russos. Mesmo assim, existe, como demonstrado nos discursos, um desejo da Otan em integrar a Ucrânia, ou ao menos estreitar a colaboração.
“Reafirmamos que estaremos em posição de convidar a Ucrânia a aderir à aliança quando os aliados concordarem e as condições estiverem reunidas”, diz o comunicado de líderes. “Os aliados continuarão a apoiar o progresso da Ucrânia na interoperabilidade [militar], bem como reformas adicionais no setor democrático e de segurança.”
A equação sobre a Ucrânia na Otan inclui ainda um elemento “indesejável”: a Rússia. Ao delimitar os motivos para invadir o país, o presidente, Vladimir Putin, dizia ser “inaceitável” ter mais uma longa fronteira dividida com um membro da aliança — ainda mais sendo um país que Moscou sempre considerou como parte de sua zona de influência.
Não raro, Putin cita supostos compromissos feitos nos anos 1990, de que a aliança jamais se expandiria pelo Leste Europeu (o que aconteceu nas décadas seguintes). Em junho, ele disse que um dos requisitos para iniciar as negociações de paz seria o abandono dos planos da Ucrânia de se tornar um membro da Otan. Como esperado, Kiev rejeitou a ideia, e destaca que fazer parte da aliança é a principal, senão única, forma de evitar novas invasões russas. Afinal, o principal ponto do Tratado do Atlântico norte é a garantia de que “um ataque contra um é um ataque contra todos” os membros.
De concreto, a Ucrânia sairá de Washington com promessas de envios de novos equipamentos militares — serão ao menos quatro baterias do sistema Patriot, além de um sistema Samp-T, e de promessas de envios futuros de outros sistemas, inclusive pelos EUA. No anúncio mais esperado, Blinken confirmou que caças F-16, um velho desejo de Kiev, estão a caminho, e devem começar a voar nos céus ucranianos em algumas semanas.
“Os F-16 também serão usados para reforçar a defesa aérea da Ucrânia. Estou confiante de que nos ajudarão a proteger melhor os ucranianos dos brutais ataques russos, como o ataque desta semana ao hospital infantil de Okhmatdyt, em Kiev”, disse o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, no X (antigo Twitter), se referindo ao ataque contra o maior hospital pediátrico do país, na segunda-feira. “ Os F-16 nos aproximam da paz justa e duradoura, demonstrando que o terrorismo deve falhar em todo o lado e a qualquer momento.”