Assim como no leilão do arroz, a ASR foi representada pela Bolsa de Mercadoria de Mato Grosso e pela Foco Corretora de Grãos. As duas firmas pertencem a Robson Luiz Almeida de França. O envolvimento dele no certame do arroz levou à demissão do ex-deputado Neri Geller (PP-MT) da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura na última semana.
Geller foi exonerado após a descoberta de que França foi seu assessor na Câmara dos Deputados de dezembro de 2019 a julho de 2020 e tem negócios com um de seus filhos. O ex-deputado diz que França tem muitos conhecidos na política e questiona a insistência do ministro e ex-governador da Bahia Rui Costa (Casa Civil) em fazer o leilão do arroz.
Mil e uma utilidades
A ASR Locação de Veículos é o tipo de empresa classificada por investigadores como “empresa de prateleira”. Documentos da Junta Comercial levantados pela coluna explicam o porquê.
Desde que foi criada em 2019, a empresa vem aumentando seu escopo de atuação. Hoje, está habilitada para exercer 22 atividades econômicas totalmente diversas, como serviço de buffet e recepção em repartição pública e eventos, instalação e manutenção de ar-condicionado, obras de engenharia e terraplanagem, entre outros. Ela informa à Receita que sua atividade principal é a locação de veículos e máquinas pesadas.
No dia 23 de fevereiro, a empresa incluiu atividade de atacadista de cereais entre suas atribuições. Ou seja, quando participou do leilão do milho, em dezembro de 2023, ela sequer tinha essa atividade
Somente em 16 de maio, 22 dias antes do leilão de arroz importado, a empresa incluiu entre suas atividades a importação e exportação de cereais e leguminosas. Com isso, arrematou o terceiro maior lote, no valor de R$ 112 milhões.
A empresa já teve oito sócios. O endereço que apresenta é um coworking que oferece salas para reuniões eventuais.
Na época do leilão do milho, a empresa estava em nome de Amanda dos Santos Araujo. Ela consta como dona da ASR de 2021 até este ano, quando informou à Receita que a empresa tinha um capital social de R$ 5 milhões.
Em 19 de abril, Amanda deixa o negócio e entra Crispiniano Espindola Wanderley. Em 2020, pouco antes de adquirir uma empresa com capital de R$ 5 milhões, ele requisitou e recebeu auxílio emergencial de R$ 600 pago pelo governo na pandemia de covid-19 a pessoas que perderam a renda. O leilão do arroz foi feito já com ele na empresa.
A divisão da Conab
Entre as funções da Conab, está a de comprar alimentos para garantir ao governo estoques de forma a regular preços e evitar desabastecimento. No governo Lula, a Conab passou para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Historicamente, a empresa era vinculada à pasta da Agricultura. A mudança não alterou a divisão política, e as duas pastas seguem dividindo os cargos.
A presidência da Conab ficou com o PT do ministro Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário). O escolhido foi João Edegar Pretto, filiado ao partido. Ele é filho do ex-deputado federal e fundador do MST Adão Pretto, já falecido, que era muito amigo de Lula.
É Pretto quem assina os editais feitos pela Conab dos leilões do milho e do arroz.
O PT também emplacou Silvio Porto, diretor de Política Agrícola e Informações da Conab. Ele é próximo do ministro e ex-governador da Bahia Rui Costa (Casa Civil). Na última quarta (19), o líder da bancada ruralista, deputado Pedro Lupion (PP-PR), questionou o envolvimento de Porto no leilão do arroz e propôs a convocação do ministro.
“Como pode o senhor Silvio Porto, diretor técnico da Conab, assinar uma nota técnica dizendo a necessidade da compra de arroz por causa de desabastecimento, se a própria Conab emitia documentos reconhecendo que não havia desabastecimento?”, disse Lupion. Ele também ressaltou a ligação de Silvio Porto ao PT da Bahia, que fez a compra do milho.
Pelo acordo político, a pasta da Agricultura indicou Thiago José dos Santos, diretor de Operações e Abastecimento. Trata-se da diretoria mais importante da Conab e foi a responsável pelo leilão do arroz.
Santos foi indicado pelo ex-secretário Neri Geller, com quem já havia trabalhado, e colocado de licença remunerada pelo presidente da Conab quando explodiu o escândalo do arroz. Geller também emplacou a mulher, Juliana Geller, como assessora da presidência da Conab.